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JE ME VOULAIS ÉVÉNEMENT,

René Char 

Tradução: Rubens Espírito Santo

13 de março de 2018

 

Eu em mim em acontecimento. Imaginei-me fissura. Um outro diferente. A cabeça sacrificada que interditou o amuleto que eu trazia comigo inadvertidamente. “Imirjo” em águas escuras em busca de algo meu que se atirou para fora da minha pele. Arrasto-me no encalço da coisa. Como pode pretender-se não amar o buraco, já com a fruta entre os dentes?  Eu decido, faminto, dar-lhe o nome de perseguição. Eu já não estava mais aqui neste mundo, então, de tanta presença esmagadora entre meus artelhos. Não tardou para meu constrangimento insuflar em meu peito um órgão que não havia antes ali.

 

Parte II

(sonho da CCS)

 

Estávamos numa sala eu, minha mãe, meu irmão e meu pai. Minha mãe tinha acabado de amputar o pé, mas havia sobrado um toco que precisava ser cortado imediatamente. Então ela pegou minha furadeira azul com uma broca feita de lâmina e começou a cortar as peles que envolviam o toco do resto de osso que precisava sair. Meu irmão e meu pai olhavam parados, intactos. Minha mãe cortava a perna friamente e eu urrava de dor, chorava e tentava me segurar nas paredes pois não conseguia ficar em pé – eu chorava a dor do resto da perna que penava para sair

 

Poema original:

Je me voulais événement. Je m'imaginais partition. J'étais gauche. La tête de mort qui, contre mon gré, remplaçait la pomme que je portais fréquemment à la bouche, n'était aperçue que de moi. Je me mettais à l'écart pour mordre correctement la chose. Comme on ne déambule pas, comme on ne peut prétendre à l'amour avec un tel fruit aux dents, je me décidais, quand j'avais faim, à lui donner le nom de pomme. Je ne fus plus inquiété. Ce n'est que plus tard que l'objet de mon embarras m'apparut sous les traits ruisselants et tout aussi ambigus de poème.

 

Tradução literal:

Eu queria um evento. Imaginei-me partição. Fiquei de fora. A cabeça da morte que, contra a minha vontade, substituiu a maçã que eu freqüentemente coloquei na minha boca, só era visível para mim. Fiquei de lado para morder a coisa corretamente. Como não se erra, como não se pode pretender amar com uma fruta tão grande para os dentes, eu decidi, quando estava com fome, dar-lhe o nome de maçã. Eu não estava mais preocupado. Foi apenas mais tarde que o objeto do meu constrangimento apareceu-me sob as características gotejantes e igualmente ambíguas de um poema.

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