Sobre a Cabana
Ana Viotti, 11 de setembro de 2018
Rubens constrói sua vigésima cabana.
Há doze anos atrás (não precisa escrever atrás, pois o há já indica tempo passado), Rubens construía sua primeira cabana, Cabana Josias (protótipo) dentro do Atelier do Centro, que no mesmo ano foi montada na galeria Baró Cruz, com algumas alterações.
Essa mesma cabana - Josias - que parecia ter uma dimensão de 4 x 4m no máximo, com uma poltrona e uma pequena biblioteca construída pelas mãos de Rubens com ajuda de uma ou duas pessoas, sua conta no banco no vermelho é uma vontade que absurda pode ser encontrada em qualquer ponto, qualquer pequeno recorte da Cabana Frei Otto.
Após a construção de 19 cabanas, após 12 anos, é possível pontuar questões plásticas já pensadas por Rubens que se desenvolveram com o fazer. Que perguntas foram feitas e então aprimoradas, reelaboradas na medida em que Rubens como homem e como artista foi desenvolvendo a partir dessa construção?
Construção essa que chamo de Cabana.
Hoje, convivendo e escutando Rubens falar sobre sua construção, sei que as cabanas foram essenciais para uma chave virar nele, que foi quando de fato seu trabalho começou. Quando começou a entender de fato algo sobre si.
Houve um tempo em que a grande preocupação era a plástica. Ou seja, se delimitava pelo âmbito plástico da coisa.
Na verdade, acredito que a preocupação de RES sempre foi muito além da plástica em si, mas a sua tecnologia, sua capacidade de tradução e conversão ainda se delimitavam nesse espaço, nesse suporte nomeado cabana.
O que então se altera nesses 12 anos? O que a Cabana Frei Otto abarca ou apreende que a Cabana Josias não?
Retorno da ideia de arquitetura enquanto a construção do espaço interno de um sujeito através da construção de sua habitação, onde sua habitação não é o espaço onde dorme, mas é o corpo onde ele mora.
Anna Israel, Mapeamento de alguns pontos fundamentais sobre a cabana Frei Otto de res na FAMA em Itu
As formigas tecelã fazem parte de um pequeno grupo da natureza que são chamados de seres eussociais.
A eussocialidade é o mais alto grau de organização dos animais presente nas sociedades mais complexas. Onde deriva três pontos fundamentais:
1. Sobreposição de gerações em um mesmo ninho (hierarquia)
2. Cuidado coletivo com a prole
3. Divisão de tarefas ( reprodutores e operários)
Além disso, são uma espécie diferente das outras formigas, constroem lá seus ninhos em lugares altos a partir da seda produzida por suas larvas, somado a folhas de plantas. Elas tecem seus ninhos que devem ser abandonados e construídos novos, quando as folhas secam e com isso ficam vulneráveis.
Não acredito que hoje a preocupação de Rubens se dê só na plástica. Hoje Rubens tem um complexo, um Conglomerado Atelier do Centro que reúne 5 espaços físicos em São Paulo e um na Espanha. Hoje, conta com mais de 30 alunos e 20 assistentes.
Para construir a Cabana, Rubens não precisa mais de fato tocá-la. Existem jovens tecendo com suas sedas as folhas elegidas por Rubens para estruturar um abrigo pelos nossos próximos dois anos.
O que estrutura essa construção não mais são apenas recursos de Rubens.
Rubens não mais é o criador da Cabana. O único agente.
O tempo, a fábrica, os discípulos e assistentes, os materiais, todos que cruzarem esse caminho são a construção.
As folhas vão secar, e uma nova estrutura irá se reerguer, assim como é feito há tantos anos, a espécie há de continuar.
A rede não é um fazer; é desprovida de todo um para; todo o excesso de para
reduz a rede a farrapos no exato momento em que a sobrecarga do projeto é
nela depositada.
Deligny, O aracniano e outros textos
A Cabana há muito deixou de ser um fim. Um espaço com uma poltrona e biblioteca, ordenado por vários materiais formando uma composição.
A Cabana não mais é um espaço físico, mas uma estrutura interna evocada por qualquer um que cruze o seu caminho.