REFLEXÕES DENTRO DA NOITE DE RES
Terça-feira, 27 de agosto de 2019
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Sobre os desenhos de sexta. De uma ótica não previsível. De um lugar outro. O que está em jogo por trás do jogo? O que movimenta a mola? O que me move a me mover? O que movimenta engrenagens de coisas que tocam outras coisas fundamentais ainda que eu não saiba? O que vive de intocável em mim, e que por minha falta de ambição e instrumentos apropriados nunca verei? Morrerei ignorante de tantas coisas em mim devido a minha preguiça. A estas coisas preguiçosas em mim arremeto meu desenho, meu esforço, minha potência, quero penetrar num território inimaginável a mim, que não me pertence, o que me pertence não me interessa. O que eu sei eu abro mão. O que eu sou destro eu menstruo.
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Sobre a vida - a vida mesma aqui. Nada sei da vida e isto me impulsiona. Isto me põe em deriva, isto é: para frente. Um frente que não é somente em direção do futuro, mas do futuro do futuro, do futuro do passado, do passado do passado, de um tempo em mim incatalogável. O incatalogável de mim cria um discurso dele mesmo, uma terminologia própria, isto é imprópria, impropria-se a si mesmo. Destituir a razão como dona de mim, isto não é irracional, é um novo procedimento racional. A máquina ferina de mim a serviço de um animal aprendendo novos truques, truques de ser outra coisa, animal se revirando para se adaptar num lugar onde coisas estão deixando de ser o que eram. A velocidade das coisas é outra, a velocidade dentro de mim é outra. Os códigos serão outros. As disciplinas aprendidas na universidade agora são papel de pão. Embrulho de alguma coisa mutável. A esta mutável máquina animal reajo. O desenho é um resquício desta atividade de ciscar, ciscar o cisco de mim. Até ele se converter numa dinâmica que me põe em assalto. Em assalto estado desqualificado de agir, assim e só assim posso fazer algo neste mar de contradições, absorto assim no meio de um líquido denso e incontornável, a-sistemático, impróprio, incorrigível dentro de uma norma conhecida por mim, fora de uma tabela de comportamento aceitável, posso enfim fazer um acerto de contas provisório com meu estar aqui. Aqui de mim sou.
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Sobre arte, de um ponto de vista de quem faz. Quem faz? Quem faz não faz, realmente quem faz desfaz. Fazer já era. Vomitou. Ressarciu. Fudeu. Fazer é fuder a coisa. É envelhecer com a coisa, aqui em questão está o outro de fazer, isto é alucinação numa cabeça loira, numa cabeça branca de um tempo que não passa nem está parado, um tempo mítico, um tempo de Deus, um tempo que me envolve sem eu perceber que estou envolvido, como este texto que me envolve num cobertor de tecido inviolável. O desenho é inviolável porque é um tecido do próprio tempo, tenho que inviolar o tempo se quiser escrever do escrever o desenho. Este texto não tem nada a ver com Derrida, ele derruba Derrida, ele é ferino onde a reflexão não pode atuar. Irrefletido estou em desenho. Fazer prescreveu! Se não faço, o que estou a fazer quando desenho? Infaço. Infecção. Desfazer. Inchaço. Sexta é uma infecção. Infecção de quê? Obviamente sabemos pouco sobre as doenças. Sobre o vírus. O desenho é uma tecnologia infecciosa dentro da minha consciência. (ou ela se expande ou morre)
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Arte de um ponto de vista do agradecimento e não do extrativismo. Agradecimento à vida e não de prostração à vida. Apreciação à vida e não depreciação à vida! Minha arte é um elogio à vida ainda que atravessada de infecções. Um elogio à vida ainda que sabendo que ela é uma luta ferrenha contra a morte! Um elogio à vida, ainda que sabendo que cada ato meu conduz à morte.
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Agradecimento do ponto de vista de quem faz e não de procrastinação. Odeio a demora. A lentidão. A languidez. A acídia. Sou um cara da simplicidade. Da precisão. Da insuficiência. Da incompletude. Da ausência de recursos. Da gagueira. Por isto quis ser: sisu